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Cultura, Consciência e Arte

Busca de reconhecimento marca início da música popular

Em trabalho realizado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, a socióloga Lilian Alves Sampaio procurou refletir sobre a música praticada fora dos ambientes eruditos, uma prática cultural hoje amada e socialmente valorizada, mas que no inicio do século 20 era menosprezada. Em sua tese de doutorado, intitulada Vaidade e Ressentimentos dos músicos populares e o universo musical do Rio de Janeiro no início do século XX, Lilian pesquisou sobre o momento no qual começam a surgir os primeiros compositores e músicos profissionais da música de divertimento nacional, fora dos teatros.

Distinção entre música popular comercial e “artística” surge na década de 1920
Foram escolhidas as trajetórias biográficas de seis músicos do período como base para a análise feita na tese. Segundo a pesquisadora, o critério para a escolha dos artistas “não foram seus feitos, mas sim o fato de terem chamado a atenção dos homens de letras da época”. São eles Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Eduardo das Neves, Catullo da Paixão Cearense, Sinhô e Pixinguinha, todos músicos compositores que alcançaram um grande sucesso comercial e tiveram seus nomes imortalizados por alguns escritores. “É essa relação entre a percepção dos escritores, agentes da cultura legítima, e das condições de existência dos músicos vindos das camadas mais destituídas de capital cultural e econômico, um dos eixos da análise”, justifica a socióloga.

Reconhecimento
Um dos temas principais tratado neste estudo, foi a questão do reconhecimento comercial e artístico oferecido pela sociedade da época aos músicos não eruditos. A autora explica que “hoje, o reconhecimento comercial figura em um polo diferente do reconhecimento artístico e estrutura o espaço de produção da música popular nacional, mas naquele momento histórico não havia esta separação na percepção das pessoas.” O que hoje chamamos música popular e que pode ser distinta em “música de boa qualidade” e “música de má qualidade”, era apenas música de divertimento e se opunha à música de concerto, ou música erudita européia. É apenas na década de 1920 que surgem as primeiras distinções entre uma música popular comercial feita para atingir um publico extenso, ou a ”massa”, e uma música popular artística apreciada por um público mais restrito com dispositivos de apreciação mais racionalizados.

Esse processo de legitimação, que irá definir o que hoje consideramos os clássicos da música popular brasileira, foi iniciado por alguns intelectuais, escritores, políticos, músicos concertistas, imbuídos de um ideal de construção de uma identidade nacional, já nos primeiros anos do século. A música de divertimento, já bastante desenvolvida nesse momento, irá chamar a atenção dos homens de letras e músicos concertistas, como Mello Morais Filho, Brasilio Itiberê, Andrade Murici, Alberto Nepomuceno, Sérgio Milliet entre outros. Mas foi Mário de Andrade o primeiro a formular claramente a distinção entre uma música popular artística e uma música puramente comercial.

Em meio a esse processo de legitimação a atividade dos músicos populares assumiu um caráter ambíguo, pois ocupava uma posição inferior em relação à música erudita européia, mas ao mesmo tempo era largamente difundida pela sociedade e reconhecida como uma importante expressão cultural por alguns agentes da cultura legítima. Além disso, vale destacar que “a identidade de músico oferecia uma compensação a outros signos sociais bem mais negativos, como ser ‘negro’, ser ‘pobre’, ‘não ter escolaridade’ ou ser ‘uma mulher separada do marido’”, diz Lilian.

Vaidade
É essa ambiguidade da condição do músico popular que oferece uma base para compreender a vaidade e ressentimento dos músicos testemunhada pelos escritores da época. A pesquisadora cita como exemplo o caso de Catullo da Paixão Cearense, autor de “Luar do Sertão”: “Há testemunhos que contam como ele se irritava e se recusava a continuar quando não o ouviam declamar sua poesia em silêncio”. Outro episódio citado pela pesquisadora, foi a vez que Sinhô entrou na Casa Edson para reclamar o pagamento de seus direitos autorais e num gesto altivo, com os braços abertos apontando as paredes da loja, disse: “tudo isso é meu”. “Ernesto Nazareth era descrito como fechado em uma “torre de marfim” por algumas pessoas que o conheceram e Chiquinha Gonzaga reclama amargamente, nas raras cartas encontradas por sua biógrafa, Edinha Diniz, sobre a “injustiça” que sofreu ao ter suas composições “boas e lindas” preteridas por “tudo que há de indecente, porco e nojento” dos novos compositores”.

A pesquisadora dá sua própria interpretação dos fatos: “a sociedade ofereceu elementos que constitui a base dos anseios sociais e da crença desses músicos em seu alto valor, mas não ofereceu as recompensas sociais e materiais que eles esperavam”. Os músicos recebiam dois tipos de informações diferentes nas suas interações cotidianas, uma sobre sua importância social e sobre o afeto que despertavam em toda a população, outra sobre sua inferioridade social e cultural, o que dava ensejo a uma percepção discrepante de si mesmos.

Para saber mais!

Dados artísticos de Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Eduardo Neves, Catulo da Paixão Cearense, Sinhô e Pixinguinha. (Fonte: Dicionário Cravo Albin).

Texto:
Redação Agência USP
Publicado em 26/março/2012 | Editoria: Cultura
Bruno Capelas, especial para a Agência USP de Notícias

março 27, 2012 Posted by | Albin, Jobim, MPB, Pixinguinha | , , , , , , | Deixe um comentário

Taí! Abre Alas para o Carnaval

Carnaval: uma festa pagã, com todo conhecimento religioso, filosófico e

com uma grande forcinha da astronomia

“Taí” (Joubert de Carvalho)

 

 

A igreja Católica determina a data da Páscoa (ressurreição de Jesus Cristo) através de cálculos “quase” mirabolantes. Mas tanto a Páscoa Cristã quanto a Judaica têm seus calendários baseados nas fases da Lua. A Páscoa é determinada em razão do primeiro domingo após a lua cheia que seguir o equinócio (posição do Sol que marca o começo da Primavera) no hemisfério Norte. Pelos cálculos, mais ou menos próximo ao dia 21 de março. No hemisfério Sul, equinócio de Outono, que também começa por volta da mesma data. Mas, em virtude de cálculos “quase” mirabolantes, a Páscoa pode variar entre 22 de março e 25 de abril. E o Carnaval também, obedecendo a regra de sete domingos antes da data Cristã.

Seguindo a regra acima, e precedendo a quaresma, estamos fadados aos atos carnavalescos. Que já foi muito melhor. Não por saudosismo. É que as pessoas eram melhores mesmo. A tecnologia avançou muito, os recursos em diversas áreas do conhecimento são extremamente favoráveis ao desenvolvimento humano. Mas ao ver de perto (e ninguém é normal), parece que o Ser Humano realmente estagnou. E não evolui. Sim, evolução, quando muito, só na Sapucaí.

Voltando ao Carnaval. A grande festa “popular” era o Entrudo, uma tradição portuguesa, copiada ou adquirida das ilhas de Cabo Verde e da Madeira. No Brasil, a folia foi introduzida em meados do século XVI, muito embora não se limitasse às classes populares: D. Pedro I e o filho D. Pedro II foram adeptos do Entrudo. Naquela época, no entanto, a brincadeira era silenciosa, pois não havia música no contexto “carnavalesco”, oras pois, o Entrudo. Foto > Entrudo

Mais tarde, por volta de 1872, surgem os ranchos carnavalescos, que de fato eram mais populares. Neste período ocorreu a introdução da música no Carnaval, e ficou então muito mais brasileiro. A primeira música feita no Brasil para animar o Carnaval foi Ó Abre Alas, composta por Chiquinha Gonzaga (Francisca Hedwiges de Lima Neves Gonzaga), em 1899.

chiquinha1

No início do Século XX, alguns dos melhores mestres da Música Popular Brasileira de todos os tempos – “Nunca antes neste País” – deram continuidade ao espetacular trabalho de Chiquinha Gonzaga. Entre eles, Sinhô, apontado como o "Rei do Samba", Ary Barroso, Lamartine Babo, Noel Rosa, João de Barro (Braguinha), Haroldo Lobo, João Roberto Kelly. E Joubert de Carvalho, autor de "Pra você gostar de mim", popularmente conhecida como “Taí”, composição feita especialmente para Carmem Miranda.

Se tivesse um roteiro, a primeira cena musical de qualquer carnaval começaria com “Ó Abre Alas” (Chiquinha Gonzaga). A trilha sonora teria ainda “Taí” (Joubert de Carvalho), “O teu cabelo não Nega” (Irmãos Valença/Lamartine Babo), “Pierrot Apaixonado” (Heitor dos Prazeres/Noel Rosa), “As Pastorinhas” (Braguinha/Noel Rosa), “Máscara Negra” (Pereira Matos/Zé Ketti), "Jardineira" (Humberto Porto/Benedito Lacerda) e “Bandeira Branca” (Sidney Miller/Paulo Thiago) . Para encerrar, Tristeza (Niltinho/Haroldo Lobo).

“Ó Abre Alas” (Chiquinha Gonzaga)

“O teu cabelo não Nega” (Irmãos Valença/Lamartine Babo)

“Pierrot Apaixonado” (Heitor dos Prazeres/Noel Rosa)

“As Pastorinhas” (Braguinha/Noel Rosa)

“Máscara Negra” (Pereira Matos/Zé Ketti)

"Jardineira" (Humberto Porto/Benedito Lacerda)

Bandeira Branca (Sidney Miller/Paulo Thiago)

Tristeza (Niltinho/Haroldo Lobo)

março 5, 2011 Posted by | Uncategorized | , , , , , , , , , , , , | 1 Comentário

Compositoras: Chiquinha Gonzaga e Teresa Cristina

 

Post dedicado aos amigos Marcos Massolini e Cristina Canos: 17 anos!

De um extremo ao outro, este 28 de fevereiro, último dia de um mês mais curto, é a data comemorativa de duas compositoras que têm significado amplo na história passada e recente da MPB.

Primeiro, Chiquinha Gonzaga (Francisca Hedwiges de Lima Neves Gonzaga, 1847- 28/2/1935, Rio de Janeiro), lembrando os 75 anos da morte da maior compositora, regente e pianista do Brasil. A "mãe" da Música Popular Brasileira foi pioneira na vida musical e pessoal, quebrou tabus nos cenários artístico e feminino, que lhe devem este reconhecimento. Participou ativamente dos movimentos abolicionista e republicano. Esteve à frente de sua época em todos os sentidos.

Saiba mais sobre Chiquinha Gonzaga lendo o texto de Abel Cardoso Junior.

Livro: Chiquinha Gonzaga, Uma história de vida Edinha Diniz

 

DVD Chiquinha Gonzaga

Segundo, a cantora e compositora Teresa Cristina (Teresa Cristina Macedo Gomes, 28/2/1968, Rio de Janeiro), carioca de Bonsucesso, que foi manicure, fiscal do Detran, programadora de rádio na UERJ, vendedora de cosméticos e auxiliar de escritório. Uma das responsáveis pela repaginação da música no bairro carioca da Lapa, fez o curso de Letras na UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro). Faz parte do grupo Semente. É a aniversariante de hoje!

Abriu a voz e encantou os ouvidos de compositores consagrados, do público e até da grande e pequena mídia. Com o primeiro CD (“A música de Paulinho da Viola”, 2002), Teresa Cristina conquistou o prêmio Rival BR e Prêmio TIM de música, como cantora revelação. Em 2003 foi indicada ao Grammy Latino de melhor disco de samba.

Sobre a moça, alguns depoimentos:

 

"Ela forma com dona Dona Ivone Lara (Yvonne Lara da Costa) e Leci Brandão (Leci Brandão da Silva) uma espécie de santíssima trindade das mulheres incluídas entre os nossos melhores compositores de samba. Tradicionalmente, salvo raras e eventuais exceções, o mundo da criação do samba é um território quase exclusivo dos homens. Mas Teresa entrou nele pela porta da frente, inventando melodias bonitas e com o talento dos nossos melhores poetas da música". (Sérgio Cabral / * clique saiba mais sobre o jornalista).

"Esta menina é coisa nossa, coisa muito séria". (Monarco– Hildemar Diniz).

"É uma figura jovem e cativante, excelente cantora de samba. A gente está precisando de cantoras assim, porque hoje em dia não tem gente interpretando samba como ela". (Paulinho da Viola – Paulo César Batista de Farias).

"Tem papel de liderança num grupo que reza pelo estilo brasileiro de cantar. Inova sem agredir o formato. Tem tudo para se tornar um nome de primeira grandeza." (Elton Medeiros – Élton Antônio Medeiros).

"Ela é maravilhosa. É uma devota do samba, que vai às raízes e pesquisa. Uma artista íntegra, que interpreta sem afetação. O exemplo de uma história verdadeira. (Marisa Monte – Marisa Monte – Marisa de Azevedo Monte).

Vídeo (*)

(*) Acalanto / O Mar Serenou, que faz parte do CD "O Mundo É Meu Lugar", gravado ao vivo em 2005. (Acalanto, Teresa Cristina; O Mar Serenou, Candeia, Antônio Candeia Filho).

Página Oficial

MySpace Teresa Cristina

fevereiro 28, 2010 Posted by | Uncategorized | , , | Deixe um comentário